É final de tarde de domingo. Enquanto escrevo este texto, luto para não pegar o meu smartphone e verificar as mensagens do WhatsApp. Meus amigos, provavelmente, estão falando sobre futebol, um dos meus assuntos preferidos. Meus filhos estão na sala. O mais velho joga videogame enquanto que a caçula assiste vídeos online em um tablet. Minha esposa já há algum tempo desliza o dedo na tela do Facebook.
Todos os dias estamos expostos a um oceano de informações que nos distraem. Isso não é um quadro atual, mas se agravou nos últimos anos, prejudicando nossa capacidade de nos concentrarmos. Esse fenômeno já havia sido descrito em 1977 pelo economista vencedor do Nobel Herbert Simon: “A riqueza de informação cria pobreza de atenção, e com ela a necessidade de alocar a atenção de maneira eficiente”.
Alocar a atenção de maneira eficiente para produzir trabalhos profundos é um dos grandes diferenciais dos trabalhadores da era do conhecimento. Quem resume essa hipótese é Cal Newport, em “Trabalho Focado, como ter sucesso em um mundo distraído” (Alta Books, 2018): “A capacidade de realizar trabalhos profundos está se tornando cada vez mais rara, ao mesmo tempo em que se torna cada vez mais valiosa em nossa economia. Consequentemente, os poucos que cultivam essa habilidade, e a transformam no centro de sua vida profissional, prosperam”.
O cenário pode ser pior do que o vislumbrado por Newport. A capacidade de manter o foco e produzir trabalhos cognitivamente complexos não significa apenas prosperidade, mas sobrevivência em um momento de grandes avanços na inteligência artificial. Num estudo chamado “O futuro do emprego”, Carl Frey e Michael Osborne chegam a uma estimativa perturbadora: 47% dos empregos nos EUA correm grande risco de serem computadorizados nas próximas duas décadas. Evidentemente, o alvo são os trabalhos superficiais – aqueles que não costumam agregar valor e são fáceis de replicar.
A boa notícia é que a habilidade de nos mantermos concentrados para produzirmos trabalhos expressivos pode ser aprimorada. Daniel Goleman em “Foco” (Objetiva, 2014), argumenta que a atenção funciona como um músculo: se não a utilizamos, fica atrofiada; se a exercitamos, se desenvolve e se fortalece. Podemos fortalecer o nosso músculo da atenção meditando alguns minutos por dia, evitando a execução simultânea de várias tarefas e abolindo o uso da Internet em horários específicos.
Um dos piores inimigos da concentração, claro, são as redes sociais. Tal constatação já não gera muito debate; todos sentimos isso. Para algumas pessoas, essas ferramentas são vitais para o sucesso e felicidade. Entretanto, para a maioria, os impactos negativos dessas ferramentas na vida pessoal e profissional superam substancialmente os impactos positivos. Nesses casos, para o bem da nossa atenção, o melhor a se fazer é abandoná-las.
A atual subvalorização da concentração não afeta apenas nossa produtividade. Sofrem também nossas relações interpessoais, nossa capacidade de interpretação e até a nossa empatia. Quanto mais distraídos estamos, mais superficiais são nossas conclusões. É o fim do “pensamento meditativo”, uma forma de reflexão que, como bem definiu o filósofo Martin Heidegger, é a essência da nossa humanidade. Precisamos prestar atenção para não nos tornarmos máquinas, ou sermos substituídos por elas.
Excelente reflexão meu caro! Estamos cada vez mais rendendo menos devido ao grande número de informação que nos bombardeia diariamente, prejudicando nossa memória e atenção. Realmente, é muito difícil conseguir se focar em uma única coisa hoje em dia. Precisamos nos desconectar para nos conectar 🙂